“A necessidade de aumentar os ganhos do governo pode soar contraditória para o empresariado que anseia pelo liberalismo prometido em campanha e nomeações.”
O título deste ensaio pode sugerir tratar-se de um apólogo, mas não é essa a pretensão. Nem é uma questão de gênero; é uma questão de propósitos. E também uma questão de princípio: de como o novo Governo vai principiar suas políticas fazendárias.
A fusão entre Fazenda e Planejamento criará a figura bipolar de um órgão arrecadador que também será quem controla os gastos.
O Tesouro Nacional tem severos e vultosos compromissos, que exigem da administração que se inaugura em primeiro de janeiro o manejo inteligente da tesoura. Cortar despesas é fundamental, mas eleger as mutilações não é tarefa fácil, nem está completamente à mão do futuro Ministério da Economia.
Será o mesmo órgão que enviará ao Congresso Nacional as tentativas de ampliar a arrecadação de tributos e projeto de lei orçamentária, onde estarão desenhados os cortes pretendidos. Ao parlamento, porém, desde a aprovação da Emenda 86 à Constituição, assiste o poder de acrescentar itens ao orçamento, os quais não podem mais ser contingenciados em percentual superior ao do contingenciamento de outras despesas.
É uma equação complexa, que requer perícia.
A necessidade de aumentar os ganhos do governo pode soar contraditória para o empresariado que anseia pelo liberalismo prometido em campanha e nomeações. A perplexidade já se insinua, nas interjeições de uma seleta plateia reativa à fala sobre cortes no Sistema S.
São matizes de muitas tonalidades para combinar num único quadro.
O que se tem como um certo consenso é que os privilégios pantagruélicos no setor público precisam ser alvejados, entretanto não se os pode mirar, sem atingir a previdência. E sempre haverá os ferrenhos protetores das benesses, em qualquer composição do Legislativo e dentre os formadores de opinião.
Mesmo que o poder mude de mãos, baixo clero ainda é clero. As lâminas terão de estar afiadas para desafiá-lo.
Será que os novos cortes atingirão as novas cortes?