Exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família é reconhecida nos Tribunais

É possível afirmar que a literalidade da norma prevê que os imóveis que detém como destinação a entidade familiar são, via de regra, impenhoráveis. Para tanto, foi editada a Lei nº. 8.009/90 que estabeleceu os parâmetros dessa proteção jurídica conferida ao imóvel familiar, também disciplinada pelo art. 833, II do CPC que protege os bens móveis que guarnecem a residência.

Entretanto, muito embora os diplomas jurídicos abarquem uma ideia protecionista à entidade familiar (isso porque, o inciso VIII do art. 833 prevê a impenhorabilidade da pequena propriedade rural que seja trabalhada pela família), há exceções legais reafirmadas pela jurisprudência que preveem a possibilidade de que essa benesse não alcance essa modalidade de bem imóvel.

A título de exemplificação, o art. 833, §1º do CPC prevê que as dívidas relativas ao imóvel que recebe referida proteção jurídica, são capazes de afastar a sua impenhorabilidade. Assim, caso uma família não efetue o pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), poderá em sede de execução fiscal sofrer a penhora do imóvel classificado como bem de família.

Além disso, os devedores de pensão alimentícia proprietários de imóveis com essa característica também não dispõem desse cenário, assim como fiadores de contratos locatícios.

Nesse sentido, a questão que abrange os instrumentos contratuais mencionados está presente no tema nº. 295 do STF que disciplinou a constitucionalidade da exceção à impenhorabilidade do bem de família nas hipóteses em casos de contrato de locação. Entretanto, posteriormente, o STF julgou a repercussão geral sob o tema nº 1.127, na qual, em sede de Recurso Extraordinário, era suscitada a inconstitucionalidade da penhora do bem de família dado em garantia por fiador em um contrato de locação comercial.

Os recorrentes embasaram o pleito à luz de garantias constitucionais, como o princípio da dignidade da pessoa humana, o direito social dos indivíduos à moradia e a proteção à família amparada pelo Estado como base da sociedade, segundo art. 226 da CF, para que, mesmo diante dessas situações, fosse mantida a impenhorabilidade.

Todavia, não havendo que se falar em distinção do contrato de locação comercial com o residencial, foi reconhecida a possibilidade de penhora do bem de família dado em garantia nos dois casos. Em seu voto, o Ministro Relator Alexandre de Moraes disciplinou que “caso a intenção do legislador fosse a de restringir a possibilidade de penhora do imóvel do fiador ao contrato de locação residencial, teria feito expressamente essa ressalva”.

Dessa forma, a jurisprudência tem reafirmado hodiernamente as possibilidades que afastam a impenhorabilidade do bem de família. Recentemente, o STJ proferiu decisão em sede dos recursos especiais repetitivos, sob o tema nº. 1.091, reconhecendo a possibilidade de penhora de bem de família dado como garantia por fiador em uma relação locatícia, seja essa residencial ou comercial, em consonância ao disposto no art. 3º, VII, da Lei nº. 8.009/90, prevalecendo-se o fomento às moradias inseridas no mercado imobiliário.

De fato, o ato de oferecer como garantia determinado bem reside na autonomia de vontade exercida pelo fiador de ambas as modalidades de contrato. Isso posto, de modo a preservar o princípio da isonomia e tendo em vista que não houve previsão legal acerca da distinção entre a exceção à impenhorabilidade do bem de família dado pelo fiador em garantia nas espécies de contrato de locação, essa possibilidade deve ser aplicada tanto para contratos de locação comercial, quanto residencial.

[Artigo escrito por Murilo Maldonado Castro]

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