O ajuste fiscal e a fiscalização desajustada

“Como já aconteceu em outros momentos de desarranjo brutal nas contas públicas, as autoridades fazendárias tendem a aumentar e até mesmo criar obrigações tributárias novas por meio de atos infra-legais.”

Tendo como timoneiro o Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o Governo Federal tem proposto ao Congresso Nacional diversas medidas com o propósito de reduzir gastos e aumentar a arrecadação. O setor produtivo é, sem dúvida, quem mais sofrerá o impacto das mudanças.

É certo que alterações que dependiam exclusivamente do Poder Executivo já foram realizadas, como, por exemplo, a tributação pelo IPI nas distribuidoras pertencentes a indústrias de cosméticos, setor que, até então, não estava onerado ao máximo e que vinha apresentando significativos crescimentos anuais. O que se constata, porém, é que, embora empreendidas as medidas de elevação de tributos que poderiam ser feitas pelo Governo, o mesmo não se observou quanto ao corte de despesas. A ligeira redução no número de ministérios, de 39 para 38, além de tímida, não desmobilizou a estrutura dedicada às relações institucionais, que agora se vincula à Vice-Presidência da República.

No Congresso, em meio a disputas político-partidárias difusas, o ajuste encontra maiores dificuldades. Algumas propostas do Palácio do Planalto têm saído do parlamento com avarias que reduziram a austeridade pretendida. Foi o caso do prazo para fruição do seguro-desemprego, que originalmente aumentaria de 6 messes para 18 e acabou em 12 meses. 

A expectativa parcialmente frustrada do Ministério da Fazenda criou um ambiente fecundo para arbitrariedades fiscais. Como já aconteceu em outros momentos de desarranjo brutal nas contas públicas, as autoridades fazendárias tendem a aumentar e até mesmo criar obrigações tributárias novas por meio de atos infra-legais. Embora inconstitucionais, porque deveriam decorrer de lei propriamente dita, isto é, aprovada pelo Poder Legislativo, tais artifícios arrocham a tributação e, na prática, atingem o empresariado piorando os resultados macroeconômicos. Deplorável exemplo desse expediente aconteceu no último dia 26 de maio, quando a Receita Federal expediu atos interpretativos e portarias com feições que extrapolam a competência do órgão, que não pode legislar. 

O cenário sombrio requer das empresas cautela e estudos criteriosos para além da contabilidade tributária. Cada medida que modifique a tributação deve ser iluminada com uma profunda análise jurídica, para verificação de suas legalidade e constitucionalidade, identificando os meios de combate das arbitrariedades. Afinal, como já observou Umberto Eco, “Para ser tolerante, é preciso fixar os limites do intolerável.”, e os limites, para tributação, estão traçados na Constituição e nas leis complementares.

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